26 de outubro de 2010

Nordeste sustentado pelo Sudeste: o boato preconceituoso

Nordeste sustentado pelo Sudeste: o boato preconceituoso

E-mail que circula na internet sobre arrecadação de tributos para o governo federal e a transferência de valores para estados e municípios – em outras palavras, a divisão do bolo – é extremamente preconceituoso ao induzir que a região Sudeste, “detentora da maior arrecadação”, estaria sustentando o Nordeste, cujo povo, conforme mencionado no email, “não trabalha”.

Escolas técnicas: Lula priorizou, Serra e FHC proibiram

Escolas técnicas: Lula priorizou, Serra e FHC proibiram
Não é verdade que o governo Lula não priorizou o ensino profissionalizante. Pelo contrário: ampliou a rede de 140 escolas criadas em 100 anos, para até dezembro de 2010.

Dilma e o cofre do Adhemar: mais uma mentira que circula por aí

Dilma e o cofre do Adhemar: mais uma mentira que circula por aí
O colunista gaúcho Políbio Braga é autor de um texto, amplamente difundido na web, que sustenta que Dilma Rousseff participou do roubo ao cofre do ex-governador de São Paulo Adhemar de Barros, em 1969, no Rio de Janeiro. É conversa.

O falso texto de Joelmir Beting

O falso texto de Joelmir Beting

Joelmir Beting não escreveu o artigo “O viajante”, que voltou a se espalhar pela rede nessas eleições. O texto atribuído ao jornalista ofende o presidente Lula e critica suas viagens internacionais.

Não Somos Partidários da Violência

Amigos(as),
Acabei de ler e assinar este abaixo-assinado online: «Não Somos Partidários da Violência» 
http://www.peticaopublica.com.br/PeticaoVer.aspx?pi=APO13
Eu, pessoalmente, concordo com este abaixo-assinado e acho que você também pode concordar. 
Assina o abaixo-assinado e divulga-o por seus contactos.
Obrigado, 
Jéferson Pitol Righetto
-----------------------------------------------------------------------------------------
Uma nota sua no email que envia a seus amigos pode fazer a diferença para um abaixo-assinado de grande sucesso.
Todos devemos ajudar a promover o abaixo-assinado, e agora é sua vez.
O poder da Internet está em suas mãos!
Obrigado.

18 de outubro de 2010

Crueldade atômica

 

Caía uma chuva negra. A população pensava ser óleo jogado pelos americanos, mas era uma chuva ácida, resultante da explosão com força de 21 toneladas de dinamite

Por: Moacir Assunção

Publicado em 14/10/2010

Crueldade atômica

Yoshitaka estava em um navio em Nagasaki quando a bomba explodiu. “O dia virou noite” (Foto: Danilo Ramos)

Haruko Yoshiga, de 88 anos, Yasuko Nishimura, de 79, e Yoshitaka Samedima, de 82, têm em comum a lembrança viva do maior horror jamais criado pelo homem: a bomba atômica. Lançada há 65 anos por aviões americanos, ela arrasou as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki. Os descendentes de japoneses viram nascer a maior arma de destruição em massa, cuja criação marcou um novo paradigma na história do homem, ao estabelecer que a própria raça poderia ser extinta.

Yasuko, a única natural de Hiroshima, chegou ao Brasil em 1952. Haruko e Yoshitaka, de pais japoneses, são brasileiros nascidos no estado de São Paulo, que voltaram à terra de seus ancestrais no final da década de 1930 para aprender o idioma e retomar o contato com sua cultura.
Com a guerra, não puderam voltar e se tornaram protagonistas de uma história curiosa e pouco conhecida de brasileiros, a dos hibakushas – pessoas afetadas pela bomba, das quais 130 vivem no Brasil.

Yoshitaka nasceu em Bauru e vive em um sítio em Suzano. Chegou a servir ao orgulhoso exército imperial japonês. Estava dentro de um navio militar em Nagasaki quando, em 9 de agosto de 1945, a bomba explodiu na cidade portuária de 240 mil habitantes – 80 mil morreram imediatamente. Em Hiroshima, estima-se em pelo menos 100 mil os mortos logo após a explosão. Os efeitos da radiação matariam ainda outros milhares de pessoas nos anos seguintes.

“Lembro que o navio balançou. Saímos e estava tudo escuro. A cidade inteira estava destruída”, conta. Na sequência, os soldados saíram para socorrer as vítimas da explosão da fat man (homem gordo), nome dado à segunda bomba – a little boy (menininho) havia sido jogada antes do avião Enola Gay sobre Hiroshima. Yoshitaka ficou com manchas brancas nos braços. “Após a explosão, às 11 horas, o dia virou noite. O cheiro de morte nas ruas era difícil de aguentar. Demoramos para entrar em Nagasaki. Quando chegamos, havia sobreviventes em abrigos. O resto, até as árvores, estava tudo queimado.” O brasileiro, cujos pais chegaram ao país em 1909, voltou para São Paulo em 1960.
Haruko trabalhava na zona rural de Hiroshima, a 16 quilômetros do epicentro da explosão. Mesmo assim, as consequências foram catastróficas. “A casa desabou em cima de todo mundo, espalhando cacos de vidro para todo lado. Eu vivia com mais quatro irmãos na cidade de onde meus pais saíram para vir ao Brasil”, conta. Um irmão morreu pouco após a bomba, vítima de uma febre que não passava.

Pouco tempo depois, numerosos grupos de vítimas que conseguiram sair da cidade foram para a zona rural em busca de ajuda para escapar do horror. Não era possível, entretanto, encontrar muita coisa. “Era muita gente, que alojamos numa escola, um dos poucos lugares que ficou em pé, já que tudo estava queimado e destruído. Faltava de tudo.”

Pela segunda vez, a família de Haruko tomava parte de um fato histórico. Seu pai, Fusakishi Nishimura, havia sido um dos 781 pioneiros da imigração japonesa ao Brasil, onde chegaram em 1909 a bordo do navio Kasato Maru. Somente um de seus oito filhos havia nascido em Hiroshima, todos demais eram brasileiros, ocidentalizados demais para o gosto do tradicionalista Fusakishi. Enquanto seus conterrâneos rumaram para o interior, Fusakishi ficou na capital. Vendia brinquedos de madeira feitos à mão. Alguns anos depois, conseguiu montar uma pequena fábrica no bairro da Mooca. Em de 1939, mandou os filhos de volta ao Japão. Um deles, Kenzo Nishimura, casou-se com Yasuko na cidade natal do pai. Depois da guerra, decidiram voltar. “Não tem lugar como o Brasil”, diz ela.

Saúde de ferro

A Associação dos Sobreviventes da Bomba Atômica no Brasil foi surpreendida com a existência de brasileiros natos entre as vítimas. Imaginava-se que os hibakushas eram somente japoneses e coreanos. “Como todo mundo tem traços e nomes orientais, pensávamos que não havia brasileiros.

Eles são muito reservados e muitas vezes nem a família sabia o que tinha acontecido”, conta a diretora da entidade Yasuko Saito. Somente depois de um encontro há pouco mais de um ano os sobreviventes foram estimulados a falar mais de sua origem. “A história é absolutamente surpreendente porque sempre se achou que os sobreviventes eram somente japoneses e, talvez, alguns coreanos”, afirma o professor de História André Lopes Loula, diretor cultural da entidade.

Em 2003, Yoshitaka Samedima conheceu Takashi Morita, de 86 anos, presidente da associação e também sobrevivente de Hiroshima, que perguntou sobre as manchas nos braços. Até então, nem a família sabia o que ele tinha vivido naquele agosto de 1945. A razão do segredo era o preconceito. “Nenhuma moça queria se casar com hibakushas. Achavam que os filhos nasceriam com deficiências”, explica. Por causa disso, muitas histórias ficaram escondidas.

A Associação das Vítimas da Bomba Atômica no Brasil foi fundada em 1984, com o objetivo de congregar os sobreviventes e conseguir alguma ajuda do governo japonês para os hibakushas que viviam em outros países. Na rígida cultura nipônica, os que saíram do país passaram a ser vistos como ingratos com sua pátria. Morita, que começou a organizar o movimento, foi forçado a entrar com ações judiciais contra o Japão para ver reconhecidos os direitos dos conterrâneos. Hoje os 130 sobreviventes no Brasil recebem uma ajuda de aproximadamente R$ 500 por mês e assistência médica – antes o governo japonês só atendia as pessoas do país.

Duas vezes por ano, médicos japoneses especialistas em sequelas de bombas atômicas vêm ao Brasil para consultar os hibakushas. A maior parte, entretanto, tem saúde de ferro, apesar da idade. E ao contrário da crença popular, os filhos também nasceram saudáveis.

Uma luz silenciosa

Apesar de estar no Brasil desde a década de 1950, Morita ainda fala português com dificuldade, e atribui sua longevidade ao clima tropical. Policial militar em Hiroshima, estava a pouco mais de um quilômetro do epicentro da explosão. Enquanto muitos fugiam, ele voltou à cidade para tentar socorrer vítimas. “Nunca esqueci nem vou esquecer o que vi. Milhares de corpos queimados dentro dos bondes, crianças mortas sob os escombros, o fogo avançando sobre pessoas que pediam ajuda para não morrer dentro das casas destruídas. Era um cenário de horror, parecia o fim do mundo”, descreve Morita, ainda emocionado. Na hora da explosão, ele não ouviu barulho algum, foi projetado dez metros à frente e sofreu queimaduras nas costas e nuca. O então policial atribui sua sobrevivência ao fato de estar com roupas grossas, bem alimentado e de costas para o epicentro.

Só viu uma luz silenciosa, uma espécie de flash, que percorreu rapidamente todo o seu corpo. Ao conseguir se levantar, estava tudo escuro, embora fossem 8h15. Caía uma chuva negra, que a população pensava ser óleo jogado pelos americanos para provocar incêndios, como tinha acontecido em Tóquio. Não era, tratava-se de uma chuva ácida, resultante da explosão e da radiação provocada pelo artefato nuclear com potência de 21 toneladas de dinamite. Até aquele momento, ninguém imaginava que a bomba lançada era muitas vezes mais letal que as temidas ogivas incendiárias que devastaram a capital japonesa.

Uma cena que Morita jamais esqueceu foi a de uma jovem mãe, morrendo ao lado do seu filho, que pediu ao vê-lo fardado: “Soldado, mate americanos”. No Brasil, onde chegou em 1956 ao lado da mulher, a enfermeira Ayako e os filhos Yasuko (a diretora da associação) e Tetsuji, foi relojoeiro na Rua Augusta e, depois abriu uma mercearia de produtos japoneses no bairro da Saúde, onde também funciona a sede da associação e da entidade-irmã Associação Hikabusha-Brasil pela Paz.

“Meu Deus, o que fizemos?”

A frase de espanto com as consequências do ataque a Hiroshima teria sido pronunciada pelo co-piloto Robert Lewis. Ele estava a bordo do B-29, batizado como Enola Gay, comandado pelo coronel Paul Tibbets, de onde partiu a bomba que formou o enorme “cogumelo”, fotografado pelo sargento Bob Caron. A decisão havia sido tomada no dia 25 de julho pelo presidente dos Estados Unidos, Harry Truman. Em um gabinete improvisado no cruzador USS Augusta, no meio do Atlântico, foi Truman quem ordenou o ataque nuclear contra o inimigo que havia impingido um enorme número de baixas de americanos no ataque a Okinawa. Antes, entretanto, o Japão já analisava a sua rendição, pela primeira vez na história militar do país.

O presidente americano tinha em mãos uma lista de cidades-alvo feita pelo secretário de Guerra, Henry Stimson: Hiroshima, Kyoto, Nokura, Niigata e Nagasaki. Hiroshima passou a ser um alvo prioritário por ter 40 mil soldados em sua área. No navio, Truman escreveu em seu diário: “A arma finalmente será usada contra o Japão. Parece a coisa mais terrível jamais descoberta”.

A decisão foi mais do que uma vingança contra a operação japonesa na base norte-americana de Pearl Harbor, localizada na ilha de Ohau (Havaí), na qual foram mortos 2.400 americanos. O ataque causou terríveis repercussões na opinião pública do país. Os Estados Unidos alegavam que sofreriam muitas baixas – até 200 mil – em um eventual ataque convencional ao Japão. Mas o que moveu mesmo o governo de Truman a empregar a bomba foi, segundo a maior parte dos especialistas, a intenção de dar um recado a União Soviética. Afinal, o Exército Vermelho havia destruído a máquina de guerra de Adolf Hitler – era preciso demonstrar ter em mãos uma arma mais poderosa.

Hiroshima e Nagasaki teriam sido escolhidas por se situar entre vales, o que permitiria observar os efeitos da bomba em alvos reais, sem condições de a radiação se dissipar totalmente antes de cessarem seus efeitos. Seriam as primeiras (e até hoje únicas) vezes em que a poderosa arma foi usada contra alvos humanos.

Era o fim da Segunda Guerra Mundial e o início da era nuclear e da Guerra Fria, conflito não declarado entre as grandes potências, EUA e URSS, que se estenderia por todo o século 20. O embate com as extintas potências comunistas já não existe mais. Mas os interesses econômicos do bloco de nações ricas – inclusive os da indústria armamentista – ainda são um legado das potências capitalistas a ser desarmado pela humanidade no século 21.

Donos da Petrobrás

Economia

Empresa, agora com 64% sob controle da União, garante financiamento de negócios até 2014, agiganta a Bovespa e protagoniza um dos maiores lances da história do capitalismo


Por: Revista do Brasil
Publicado em 14/10/2010


A cena de fato parecia insólita: um ex-sindicalista – que disputou sua primeira eleição em 1982 dizendo “vote 3 que o resto é burguês” – fazendo festa na Bolsa de Valores. Ele próprio fez questão de lembrar – “dez anos atrás eu passava aqui na porta da Bolsa, as pessoas tremiam de medo: ‘Onde é que vai esse comedor de capitalismo?’” – ao bater o martelo na maior oferta pública de ações já vista no mercado, iniciada em 24 de setembro. Para o presidente da BM&F Bovespa, Edemir Pinto, a economia passou a se dividir “em antes e depois da operação de capitalização da Petrobras”.

A oferta incluiu mais de 2,1 milhões de ações ordinárias (com direito a voto em assembleias) e quase 1,6 milhão de preferenciais (cujos titulares recebem antes os lucros), por meio de um aumento de capital da Petrobras. Durante a cerimônia, o presidente da estatal, José Sergio Gabrielli, informou que a oferta alcançou R$ 115,05 bilhões (ou US$ 66,9 bilhões). Parte dos recursos ajudará a financiar o plano de negócios da companhia de 2010 a 2014, que totaliza US$ 224 bilhões.
Para “um comedor de capitalismo”, Lula ajudou a dar um bom impulso, já que na véspera da operação a Bolsa paulista se tornou a segunda maior do mundo em valor de mercado, atingindo R$ 30,4 bilhões, ou US$ 17,7 bilhões, atrás apenas da de Hong Kong (US$ 19,8 bilhões). “O valor da nossa bolsa está ligado ao potencial de crescimento do país e das empresas brasileiras e fruto da operação que comemoramos nesta data”, afirmou Edemir Pinto.

Lula também enfatizou a importância da operação para a economia brasileira, em possível referência à época em que a Petrobras foi cotada para entrar na lista de privatizações e até mudar o nome para Petrobrax. “Ao contrário do passado, não estamos aqui para debilitar o Estado ou alienar o patrimônio público. Um Estado fraco nunca foi sinônimo de iniciativa privada forte”, afirmou. “A capitalização é uma das salvaguardas criadas pelo governo para evitar que essa riqueza se perca num labirinto de desperdícios e interesses equivocados.” Segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega, a União aumentou de 40% para 49% a sua participação no capital total (64% das ordinárias) da Petrobras.

Como em toda operação dessa natureza, a capitalização mexeu com o mercado de câmbio, que ainda causa preocupação ao governo, por causa do real valorizado, o que prejudica as exportações brasileiras. Durante evento na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Mantega disse que o mundo vive uma “guerra cambial”

12 de outubro de 2010

Como estrelei nas loucuras de 1929

 

O texto econômico que apresentamos hoje, nesta página, é de Marx – não o grande Karl, mas o grande Groucho Marx, o mais conhecido dos Irmãos Marx (Harpo, Chico, Groucho, e, no começo, também Zeppo e Gummo, os irmãos mais jovens).
  Em 1929, antes da hecatombe, a especulação era mais simples do que hoje. Esses gênios financeiros, sempre experts na arte de tapear o próximo, ainda não haviam inventado os derivativos – e, por isso, quem queria especular não precisava saber o que é um credit default swap (CDS) ou uma collateralized debt obligation (CDO). Bem... na verdade também hoje ninguém sabe o que é isso, nem mesmo os seus promotores: James Cayne, o troglodita que foi manda-chuva do Bear Stearns - quinto banco “de investimento” (ou seja, especulativo) de Wall Street até sua quebra, em 2008 - nunca soube o que significava nenhuma dessas expressões, apesar de vender pacotes desses papéis aos bilhões para sua clientela de patos. Aliás, ele mesmo era um deles, comprando milhões de dólares dessa papelada, sem interessar-se pelo significado dos seus nomes – até porque, em verdade, com exceção do sr. Meirelles e seu “swap reverso”, ninguém acha que eles têm algum significado.
  Dizem que somente os executivos do Goldman Sachs é que vendiam essa porcaria sem jamais comprá-la. O Goldman Sachs, como o leitor verá, já aparece citado por Groucho em 1929 – e, certamente, não por seus méritos humanitários.
  Naquela época as coisas eram realmente mais simples - os papéis negociados eram meramente ações de empresas – e nem por isso a vigarice deixava de ser a mesma, levando ao mesmo desastre.
  Os Irmãos Marx filmaram “Cocoanuts” (“No Hotel da Fuzarca”) exatamente em 1929. Por isso, Groucho cita várias vezes o filme em seu texto. Mas, prolongar esta introdução seria fazer o leitor perder tempo – o texto é um dos capítulos das memórias de Groucho, publicadas em 1951, e em 1991 no Brasil: “Groucho e Eu”, Marco Zero, trad. Maria José Silveira, págs. 161-169.

C.L.

GROUCHO MARX

Logo um negócio muito mais quente do que o show business atraiu mina atenção, e a atenção de todo o país. Era uma pequena coisa chamada Bolsa de Valores. Tomei conhecimento dela pela primeira vez em 1926. Foi uma agradável surpresa descobrir que eu era um negociante astuto. Ou pelo menos assim parecia, pois tudo que eu comprava subia. Eu não tinha um assessor financeiro. Quem precisava disso? Você podia fechar os olhos, colocar o dedo em qualquer lugar do grande quadro, e as ações que você acabava de comprar começavam a subir. Eu nunca realizava os lucros. Parecia um absurdo vender uma ação por trinta quando você sabia que ela podia duplicar ou triplicar em um ano.

Meu salário em Cocoanuts era cerca de dois mil por semana, mas isto era uma ninharia comparado com a papa fina que eu teoricamente estava ganhando em Wall Street. Entenda, eu gostava de fazer o espetáculo, mas estava muito pouco interessado no salário. Eu pegava dicas sobre o mercado de ações com todo mundo. É difícil acreditar hoje, mas incidentes como o que vou contar eram muito comuns naquele tempo.
Eu estava no elevador do Copley Plaza Hotel. O ascensorista me reconheceu e disse:
  - Sabe, Sr. Marx, havia dois caras aqui agorinha. Gente muito importante. Eles estavam usando jaquetões com cravos na lapela. Estavam falando sobre o mercado de ações e, pode acreditar, irmão, pareciam saber muito bem do que estavam falando. Eles não sabiam que eu estava escutando, mas quando estou dirigindo este elevador, sempre fico de ouvido em pé. Não vou ficar a vida inteira para cima e para baixo numa caixa dessas! Enfim – ele continuou, – escutei um desses caras dizer para o outro: “Ponha todo o dinheiro que você possa conseguir na United Corporation”.
  - Qual era o nome dessa ação? – perguntei.
  Ele me dirigiu um olhar de desprezo.
  - Qual é o problema, irmão. Seu ouvido não está funcionando bem? Eu já falei. O homem disse United Corporation.
  Eu lhe dei cinco dólares e corri para o quarto de Harpo.  Imediatamente o informei sobre essa mina de ouro em potencial que encontrara no elevador. Harpo estava acabando seu café da manhã e ainda estava de roupão.
  - Tem um escritório de corretagem no saguão deste hotel – ele disse. – Espere eu me vestir e nós vamos lá em baixo e pegamos essas ações antes que a notícia se espalhe.
  - Harpo, você ficou maluco? Se esperarmos até você trocar de roupa as ações podem subir uns dez pontos!
  Assim, eu com meus trajes de passeio e Harpo com seu roupão corremos pelo saguão até o escritório de corretagem e rapidamente abocanhamos ações da United Corporation no valor de cento e sessenta mil dólares, com uma margem de vinte e cinco por cento.
  Para os poucos sortudos que não se arruinaram em 29 e não conhecem Wall Street, deixe-me explicar o que significa uma margem de vinte e cinco por cento. Se você comprou, por exemplo, ações no valor de oitenta mil dólares, só tinha que pagar vinte mil dólares em dinheiro. O resto você ficava devendo ao corretor. Era como roubar dinheiro.
  Uma quarta-feira de manhã na Broadway, Chico encontrou um palpiteiro de Wall Street, que lhe falou em segredo:
  - Chico, acabei de vir de Wall Street e todo mundo por lá só está falando da Anaconda Copper. Estão vendendo a cento e trinta e oito dólares a ação e corre o rumor de que vai subir para quinhentos! Pegue antes que seja tarde demais! É uma barbada.
  Chico, um conhecido amante do jogo, imediatamente correu até o teatro com as notícias dessa mina. Era um dia de matinê e atrasamos o espetáculo por trinta minutos até que nosso corretor finalmente nos assegurou que tinha tido a sorte de conseguir seiscentas ações. Estávamos extasiados. Harpo e eu éramos, cada um, os orgulhosos proprietários de duzentas ações desses títulos mais garantidos. Até o corretor nos cumprimentou. Ele disse:
  - Não é sempre que alguém toma conta de uma companhia como a Anaconda.
  O mercado subia, subia, subia. Quando estávamos nos apresentando em outras cidades, Max Gordon, o produtor de teatro me chamava toda manhã de Nova Iorque, pelo interurbano, para dar a cotação do mercado e suas predições para o dia. Seu prognóstico nunca variava. Estava sempre “subindo, subindo, subindo”. Até essa época eu não imaginava que pudesse ficar rico sem trabalhar.
  Max me chamou uma manhã e me disse para comprar ações da Auburn. Era uma companhia de automóveis, agora já falecida.
  - Marx – ele disse, – este é um jogo rápido. Vai pular que nem um canguru. Compre logo antes que seja tarde.
  Como um adendo, acrescentou:
  - Por que você não sai de Cocoanuts e esquece essa mixaria de dois mil dólares por semana que está ganhando? Isso é uma bagatela. Do jeito que você está administrando suas finanças, eu diria que você pode fazer muito mais dinheiro sentado num escritório de corretagem do que se matando em oito apresentações por semana na Broadway.
  - Max – respondi, – não há dúvida de que seu conselho é sério.   Mas afinal tenho algumas obrigações para com Kaufman, Ryskind, Irving Berlin e meu produtor, Sam Harris.
  O que eu não sabia na época era que Kaufman, Ryskind, Berlin e Harris também estavam comprando na margem e que seus assessores financeiros acabariam por deixá-los “limpos” (o que foi certamente uma boa piada pra cima deles!). Enfim, a conselho de Marx imediatamente chamei meu corretor e o instruí para comprar quinhentas ações da Auburn Motor Company.

Algumas semanas mais tarde, eu estava passeando pelo campo de golfe, no Country Clube, com o Sr. Gordon. Um grande e caro charuto Havana estava pendurado nos seus lábios. Tudo estava certo no mundo e o céu estava nos olhos de Marx (junto com alguns cifrões). Justamente no dia anterior a Auburn tinha pulado trinta e oito pontos. Me virei para meu parceiro de golfe e disse:
  - Marx, há quanto tempo isto vem deste jeito?
  Marx respondeu tomando emprestado um verso de Al Jolson:
  - Irmão, você ainda não viu nada!
  A coisa mais surpreendente do mercado de 29 era que ninguém nunca vendia uma ação. O público apenas continuava comprando. Um dia, um tanto timidamente, perguntei a meu corretor em Great Neck sobre esse fenômeno especulativo.
  - Não sei muita coisa sobre Wall Street – comecei me desculpando, – mas o que faz essas ações continuarem subindo?  Não deveria haver alguma relação entre os lucros de uma companhia, seus dividendos e o preço de venda das ações?
  Por sobre minha cabeça ele olhou para uma nova vítima que acabava de entrar no escritório, e disse:
  - Sr. Marx, o senhor tem muito o que aprender sobre o mercado de ações. O que o senhor não sabe sobre títulos daria para encher um livro.
  - Escute, meu bom homem – respondi, – vim aqui à procura de conselho. Se você não pode controlar sua língua de forma civilizada, arranjarei outro lugar para fazer meus negócios! E então, o que você estava dizendo?
  Adequadamente repreendido e bastante intimidado, ele respondeu:
  - Sr. Marx, o senhor pode não ter percebido, mas este já não é mais um mercado nacional. Estamos agora no mercado mundial.  Estamos recebendo ordens de compra de todos os países da Europa, América do Sul e até do Oriente. Hoje mesmo de manhã já recebemos ordens do Industão para comprar mil ações dos Encanamentos Crane.
  Um tanto cauteloso, perguntei:
  - Você acha que esta é uma boa compra?
  - Excelente – ele respondeu. – Se há uma coisa que todos nós temos que usar é encanamento.
  (Eu poderia pensar em algumas outras coisas, mas não tenho certeza se estavam listadas na Bolsa).
  - Isto é ridículo – eu disse. – Tenho alguns amigos índios em Dakota do Sul que não usam nenhum encanamento. (Ri com vontade da minha gracinha, mas ele não, portanto continuei). Você diz que eles estão enviando ordens de compra dos Encanamentos Crane, do Industão? Hummm. Se eles estão usando canos lá no longínquo Industão, devem estar sabendo de alguma coisa quente. Compre umas duzentas ações para mim.  Não, compre trezentas.
  À medida que o mercado continuava vertiginosamente subindo, comecei a ficar cada vez mais nervoso. O bom senso tinha me dito para vender, mas como todos os outros trouxas, eu era ganancioso. Detestaria soltar qualquer ação que com certeza dobraria em poucos meses.
  Frequentemente leio histórias nos jornais de hoje sobre o público de teatro se queixando porque têm que pagar cerca de cem dólares por dois ingressos para My Fair Lady. (Pessoalmente, acho que vale). Bem, uma vez eu paguei trinta e oito dólares para ver Eddie Cantor no Palace.
  Todos nós sabemos que Eddie é um excelente cômico. Até ele mesmo não reluta em concordar com isso. Ele estava com um espetáculo maravilhoso. Cantava Margie, Now´s the Time to Fall in Love e If You Knew Susie. Fazia o público morrer de rir com as piadas do momento e terminava cantando Whoopee. No vernáculo, ele era um “estouro”. Tinha aquele “algo a mais” magnético que separa um grande astro dos atores comuns.
  Cantor era meu vizinho em Great Neck. Como velho amigo, no final do espetáculo fui vê-lo no camarim. Eddie é uma pessoa muito persuasiva, e antes que pudesse lhe dizer o quanto gostara de sua atuação, ele me puxou para dentro do camarim, fechou a porta, olhou em volta para ver se alguém estava escutando, e disse:
  - Groucho, eu te amo!
  Não havia nada de estranho nessa declaração. É simplesmente como as pessoas do teatro falam umas com as outras. Existe uma lei não escrita no teatro de que quando duas pessoas se encontram (ator e atriz, atriz e atriz, ator e ator ou quaisquer outras variações ou desvios sexuais), devem inflexivelmente evitar as saudações de rotina que as pessoas normais costumam usar. Em vez disso, devem cobrir um ao outro com termos de carinho que, em outros rincões da sociedade, estão reservados para os quartos.
  Doçura – Cantor continuou, – o que você achou do meu espetáculo?
  Olhei em volta, achando que talvez houvesse uma garota atrás de mim. Infelizmente não havia e compreendi que ele estava falando comigo.
  - Eddie querido – respondi com genuíno entusiasmo, – você estava soberbo!
  Eu já ia jogar outros buquês quando ele me olhou amigavelmente com aqueles olhos grandes e brilhantes, passou as mãos sobre o meu peito e disse:
  - Querido garoto, você possui alguma Goldman-Sachs?
  - Benzinho – respondi (dois podem jogar este jogo), – não apenas não possuo como nunca ouvi falar disso. O que é Goldman- Sachs? Algum tipo de farinha?
  Ele me agarrou pelas duas lapelas e me puxou contra si. Por um momento, pensei que fosse me dar um beijo.
  - Não me diga que você nunca escutou falar de Goldman-Sachs!  – Ele disse incredulamente. – É apenas a maior e mais sensacional companhia de investimentos e uma holding de outras empresas gigantes.
  Ele então olhou para seu relógio e disse:
  - Hummm! Já está tarde demais, hoje. A bolsa já está fechada.   Mas, meu bem, quando a manhã começar a clarear, pegue seu chapéu e corra até seu corretor e agarre umas duzentas ações da Goldman-Sachs. Acho que ela fechou hoje a cento e cinqüenta e seis... e a cento e cinqüenta e seis é um roubo!
  Eddie então deu um tapinha na minha bochecha, e eu um tapinha na dele, e nos separamos.
  Rapaz, como fiquei contente por ter ido cumprimentar Cantor nos bastidores. Imagine se eu tivesse ido no Palace naquele dia, nunca teria tido aquela dica. Na manhã seguinte, antes do café, corri até o escritório de corretagem assim que a bolsa abriu. Cobri vinte e cinco por cento de trinta e oito mil dólares e me tornei o feliz proprietário de duzentas ações da Goldman-Sachs, a maior Holding da América.
  Comecei então a passar minhas manhãs sentado num escritório de corretagem, olhando para um grande quadro fervilhando com símbolos que eu não entendia. Se eu não chegasse cedo não conseguia nem entrar. Algumas das casas de corretagem estavam contando com mais público do que muitos teatros da Broadway.
  Parecia que todo mundo que eu conhecia estava na bolsa. A maioria das conversas se limitava a comentar sobre quem havia ganho quanto na semana passada, ou sobre alguma ação que iria dar três por um de bonificação. O mecânico, o entregador de gelo, o açougueiro, o padeiro, todos eles na esperança de ficarem ricos, estavam jogando seus minguados salários – e, em muitos casos, as economias de suas vidas – em Wall Street. Ocasionalmente, a bolsa dava uma caída, mas logo se libertava dos especuladores da baixa e do bom senso e prosseguia em sua constante escalada.
  De vez em quando algum profeta financeiro fazia uma declaração sombria, avisando ao público que os preços estavam fora de proporção em relação a seu valor, e para lembrar que tudo que subia um dia necessariamente teria que cair. Mas dificilmente alguém dava atenção a esses conservadores idiotas e suas estúpidas palavras de precaução. Até Barney Baruch, o Sócrates do Central Park e consumado bruxo financeiro, fez uma declaração de aviso. Não me lembro exatamente de suas palavras, mas eram mais ou menos assim: “Quando a bolsa se torna manchete de primeira página, é hora de cair fora”.
  Eu não estava presente na Corrida do Ouro de 49. Quero dizer, de 1849. Mas imagino que a febre deveria ser bem parecida com a que agora infestava o país inteiro. O presidente Hoover estava pescando, e o resto do governo federal parecia totalmente alheio ao que estava acontecendo. Não tenho certeza se alguma coisa poderia ser feita se eles tivessem se intrometido, mas de qualquer maneira a bolsa saltava alegremente em direção à perdição.
  Num determinado dia, a Bolsa começou a balançar. Alguns clientes mais nervosos ficaram agitados e começaram a descarregar. Isso aconteceu quase trinta anos atrás e não consigo me lembrar dos vários estágios da catástrofe que estava desabando sobre nós, mas da mesma maneira como todo mundo só queria comprar no começo da subida, todo mundo agora estava vendendo enquanto o pânico se generalizava. No começo a venda foi ordenada, mas logo o medo enxotou o discernimento e todo mundo começou a jogar suas ações na arena de touro dos especuladores na alta, que agora havia se transformado na arena de ursos dos especuladores na baixa, querendo salvar qualquer coisa que pudessem.
  Então os corretores se contagiaram com o medo e começaram a gritar por margens adicionais. Esta foi uma boa piada dos corretores, pois a maioria dos negociantes já estava sem dinheiro e os corretores começaram a descarregar os títulos por seja lá o que fosse. Eu fui um dos mais tolos. Infelizmente eu ainda tinha dinheiro no banco e para evitar minha liquidação comecei febrilmente a assinar cheques para refazer as margens que rapidamente estavam se dissolvendo. Então, numa terça-feira espetacular, Wall Street jogou a toalha e entrou em colapso. A toalha é uma boa imagem, pois a esta altura o país inteiro estava chorando.
  Algumas pessoas que conheci perderam milhões. Eu tive mais sorte. Tudo o que perdi foram duzentos e quarenta mil dólares. (Ou cento e vinte semanas de trabalho a dois mil dólares cada).  Eu teria perdido muito mais, mas isto era tudo o que eu tinha. No dia do convulsivo colapso final, meu amigo, algumas vezes conselheiro financeiro e astuto negociador, Max Gordon, me telefonou de Nova Iorque. Em quatro palavras ele fez uma declaração que, com o tempo, acredito que estará entre as mais memoráveis citações da história americana. Estou me referindo àquelas frases imortais, como “Não abandone o navio”, “Não atire antes de ver o branco dos olhos deles”, “Liberdade ou morte!”.  Essas frases se perdem em relativa insignificância diante da notável frase de Marx. Nunca tendo sido um tipo de muita conversa, desta vez ele ignorou até o tradicional “alô”. Tudo o que disse foi:
  - Marx, a festa acabou!
  Antes que eu respondesse, o telefone estava desligado.
  Dentre todas as tolices escritas pelos analistas da Bolsa, acho que ninguém resumiu tão bem os destroços de maneira tão sucinta como meu amigo Gordon. Nessas poucas palavras, ele disse tudo. A festa tinha, realmente, acabado. Acredito que a única razão que me fez continuar vivendo foi o conforto de saber que todos os meus amigos estavam no mesmo barco. Até a miséria financeira, como outra qualquer, adora companhia.
  Se meu corretor tivesse liquidado minhas ações quando elas começaram a despencar, eu teria salvo uma verdadeira fortuna.  Mas já que eu não consegui imaginar que elas iriam continuar descendo. Comecei a pedir dinheiro emprestado dos bancos para cobrir rapidamente as margens que desapareciam. As ações da Anaconda Copper (lembram? Atrasamos o espetáculo trinta minutos para agarrá-las) se derreteram como as neves de Kilimanjaro (não pensem que não li meu Hemingway) e finalmente afundaram em 2 7/8. A dica quente do ascensorista de Boston sobre United Corporation mergulhou para 3 ½. Nós a tínhamos comprado a sessenta. A matinê de Cantor no Palace foi magnífica e valeu tanto quanto qualquer outra apresentação da Broadway. Mas Goldman-Sachs a cento e cinqüenta e seis dólares? Eddie, benzinho, por que você fez isso comigo? No fundo do poço da Bolsa ela podia ser arrematada por um dólar!

 

Fonte: http://www.horadopovo.com.br/

9 de outubro de 2010

8 de outubro de 2010

BC Europeu pede à China que valorize sua moeda mas premiê Jiabao diz que “yuan está muito bem”

 

A União Europeia pediu nesta terça-feira à China que permita uma “significativa” valorização do yuan, juntando-se ao mantra do governo Obama para que o país asiático se renda na guerra cambial encabeçada pelo dólar.

Segundo as samaritanas autoridades europeias, a flexibilização do regime de câmbio chinês é muito “importante para permitir um crescimento mais equilibrado em benefício da China” e da economia mundial.

  A desinteressada mensagem foi transmitida pelos presidentes do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, do Euro-grupo, Jean-Claude Juncker, e o comissário europeu de Economia, Olli Rehn, diretamente ao primeiro-ministro chinês, Wen Jiabao, com quem se reuniram em Bruxelas em paralelo à cúpula UE-Ásia.

“Devido ao importante papel da China, achamos que uma valorização ordenada, significativa e ampla permitirá promover um crescimento mais equilibrado em benefício da China e da economia mundial”, afirmou Juncker depois do encontro. “Queremos que a China equilibre seu crescimento e aumente o consumo local para reduzir o peso de suas exportações”, completou Jean-Claude Juncker de Calcutá.

Na véspera, em seu discurso durante a abertura da cúpula UE-Ásia, Jiabao disse que a China manterá as taxas de câmbio das principais moedas “relativamente estáveis” com o objetivo de “favorecer a recuperação econômica”.

Para o comissário europeu de economia Rehn, “se o euro tiver que seguir suportando uma carga desproporcionada no ajuste das taxas de câmbio mundiais, a recuperação da economia da zona do euro poderia ser debilitada”. O arguto comissário europeu não congitou em nenhum momento pedir a Obama que valorize o dólar para ajudar a UE.

SEZARIO SILVA

Um golpe de Estado financeiro-1

MICHAEL HUDSON*

  A maior parte da imprensa descreveu as manifestações e greves europeias de quarta-feira em termos do exercício habitual dos trabalhadores nos transportes que irritam viajantes com redução de velocidade no trânsito e grandes multidões a despejar sua ira. Mas a história é muito mais profunda do que simplesmente uma reação contra o desemprego e as condições da recessão econômica. Estão em causa proposta para mudar drasticamente as leis e estruturas de como a sociedade europeia funcionará na próxima geração. Se as forças antitrabalho tiverem êxito, elas fragmentarão a Europa, destruirão o mercado interno e tornarão aquele continente uma periferia. Este é o grau de seriedade do golpe de estado financeiro em curso. E está em vias de ficar muito pior – rapidamente. Como afirmou John Monks, responsável da Confederação Sindical Europeia: “Isto é o começo do combate, não o fim”.

  A Espanha recebeu maior parte da atenção, graças à sua greve de dez milhões (confirmadamente, a metade de toda a força de trabalho). Ao efetuar a sua primeira greve geral desde 2002, o trabalho espanhol protestou contra o seu governo socialista que utiliza a crise bancária (decorrente de maus empréstimos imobiliário e hipotecas com situação líquida negativa, não de custos laborais elevados) como uma oportunidade para mudar as leis e permitir às companhias e corpos governamentais despedirem trabalhadores à vontade e reduzir suas pensões e despesas públicas sociais a fim de pagar mais aos bancos. Portugal está fazendo o mesmo e parece que a Irlanda o seguirá – tudo isto nos países cujos bancos foram os prestamistas mais irresponsáveis. Os banqueiros estão exigindo que reconstruam suas reservas para empréstimos às expensas do trabalho, tal como no programa do presidente Obama aqui nos Estados Unidos, mas sem disfarces hipócritas.

  O problema à escala da Europa na verdade está centrado na capital da União Europeia, Bruxelas, onde cinquenta a cem mil trabalhadores reuniram-se para protestar contra a proposta transformação de regras sociais. No mesmo dia em que os grevistas se manifestavam, a Comissão Europeia (CE) delineava uma guerra completa contra o trabalho. A campanha mais antitrabalho desde a década de 1930 – ainda mais extrema do que os planos de austeridade impostos pelo FMI e o Banco Mundial ao Terceiro Mundo em tempos passados.

  A Comissão Europeia utiliza a crise hipotecária da banca – e a desnecessária proibição de os bancos centrais monetarizarem o deficit orçamentário dos governos – como uma oportunidade para multar governos e levá-los mesmo à bancarrota se não concordarem em baixar salários do setor público. A CE diz aos governos para tomar emprestado aos bancos, ao invés de levantarem receita tributando-os tal como têm feito durante meio século após o fim da II Guerra Mundial. E se os governos forem incapazes de conseguir dinheiro para pagar os juros, eles devem encerrar os seus programas sociais. E se este encerramento contrair a economia – e, portanto, receitas fiscais do governo – ainda mais, então o governo deve cortar mais as despesas sociais.
De Bruxelas à Letônia, planejadores neoliberais tem expressado a esperança de que salários públicos mais baixos propagar-se-ão também ao setor privado. O objetivo é contrair suas economias para reduzir níveis salariais em 30% ou mais – níveis de depressão – na crença de que isto “deixará mais excedente” disponível para pagar serviço de dívida. Os governos devem tributar o trabalho – não as finanças, seguros ou imobiliário (FIRE), impor novos impostos sobre o emprego e as vendas enquanto reduz pensões públicas e gastos públicos. Com isso, a Europa está para se transformar numa república de bananas.

  “Junte-se ao combate contra o trabalho, ou nós o destruiremos”, a CE está dizendo aos governos. Isto exige ditadura e o Banco Central Europeu (BCE) assumiu este poder [próprio] de um governo eleito. Sua “independência” do controle político é celebrada como “suprassumo da democracia” pela nova oligarquia financeira de hoje. A atual cruzada de notícias evoca a visão de Platão de que a oligarquia é simplesmente o estágio político subsequente à democracia. O próximo passo da nova elite nesse eterno triângulo político é se fazer hereditária – pela abolição de impostos sobre o patrimônio, para começar – e se transformar numa aristocracia absoluta.

  É de fato um jogo muito velho. Portanto, é hora de colocar de lado as teorias econômicas de Adam Smith, John Stuart Mill e da Era Progressista, esquecer Marx e até Keynes. A Europa está ingressando numa era regida pelo totalitarismo neoliberal. É disso que as greves e manifestações de quarta-feira tratavam. A guerra de classe da Europa está de volta – com uma vingança!

  Isto é suicídio econômico, mas a UE está exigindo que os governo da euro-zona mantenham seus deficits orçamentários abaixo dos 3% do PIB, e sua dívida total abaixo dos 60% do PIB. Na quarta-feira a UE aprovou uma lei para multar governos em mais de 0,2% do PIB por não “consertarem” seus deficits orçamentários através da imposição de tal austeridade fiscal. Nações que tomam emprestado para se engajarem em investimentos contra-cíclicos de “estilo keynesiano” que elevem a sua dívida pública ao nível de 60% do PIB terão de reduzir o excesso em 5% ao ano, ou sofrer dura punição. A Comissão Europeia vai multar os Estados da área do euro que não obedecerem suas recomendações neoliberais - de forma ostensiva para “corrigir” desequilíbrios orçamentários.

  A realidade é que toda “cura” neoliberal só torna pior as coisas. Mas ao invés de se ver a elevação dos níveis dos salários e das condições de vida como pré-condição para mais elevada produtividade do trabalho, a CE vai “monitorar” os custos do trabalho assumindo que aumentos de salários prejudicam a competitividade ao invés de elevá-la. Se os membros do euro não podem depreciar suas moedas, então devem lutar contra o trabalho - mas nunca taxar os imóveis, as finanças ou outros setores que se alimentam de renda, não deve regulamentar monopólios nem fornecer serviços públicos que possam ser privatizados a custos mais elevados. A privatização não está destinada a impedir a competitividade - só os aumentos de salários, independente de considerações de produtividade.

  A privatização financeira e o monopólio na criação de crédito que os governos cederam aos bancos, agora estão a caminhos de serem compensados – ao preço da quebra da Europa. De forma diferente dos bancos centrais em outros lugares do mundo, a carta do BC europeu (independente da política democrática, mas não do controle por seus membros, os bancos comerciais) proíbe a monetarização da dívida governamental. Os governos devem tomar emprestado dos bancos, que sua vez criam uma dívida carregada de juros nos teclados de seus computadores ao invés de fazerem seus bancos nacionais perfazerem a dívida sem custo.

   Os membros não eleitos do Banco Central Europeu usurparam o poder de planejamento de governos eleitos. Preso a sua constituição financeira, o BCE teve pouca dificuldade em convencer a comissão da UE a apoiar a nova captura oligárquica do poder. Esta política destrutiva foi bem testada acima de tudo nos países bálticos, usando-os como cobaias para ver até aonde os trabalhadores podem ser pressionados até se levantarem. A Lituânia deu rédia livre à política neoliberal impondo impostos de 51% acima sobre os trabalhadores enquanto os imóveis permaneceram virtualmente livres de taxas. Os salários dos servidores públicos foram reduzidos em 30%, levando os trabalhadores de 20 a 35 anos a emigrarem em quantidades. Isto, é claro, contribui para a queda nos preços dos imóveis e da arrecadação de impostos.
*Michael Hudson é ex-economista de Wall Street, escritor e professor e pesquisador da University of Missouri. (Continua na próxima edição)

“Mercenários da Blackwater atuam na Amazônia e nas plataformas da Halliburton”, denuncia general Nery

 

Nem mesmo o governo fantoche do Afeganistão aceita mais conviver com a Blackwater - empresa de mercenários com sede em Moyock na Carolina do Norte, Estados Unidos. Hamid Karzai acaba de tomar a decisão de proibir a atuação da empresa em seu território (leia matéria na página 6).

No Brasil, o general-de-brigada da reserva, Durval Antunes de Andrade Nery, denunciou a presença da Blackwater em reservas na Amazônia e em plataformas de petróleo na costa do país.

O general, que é coordenador do Centro Brasileiro de Estudos Estratégicos da Escola Superior de Guerra, afirmou que “membros fortemente armados da Blackwater já atuam em reservas indígenas brasileiras contando com bases fluviais bem equipadas”.

Em matéria publicada pelo jornal carioca “O Dia”, o general Nery revelou a existência de agentes da Blackwater em 15 plataformas de petróleo administradas pela Halliburton na costa brasileira. “Faço um desafio: vamos pegar um barco e tentar subir numa plataforma. Garanto que vamos encontrar os homens da Halliburton armados até os dentes e que não vão deixar a gente subir”, advertiu o general.

O militar confirmou como é a relação da Halliburton com a Agência Nacional de Petróleo: “Esta empresa (Halliburton) está envolvida com o apoio logístico em todo o mundo no que diz respeito ao petróleo, principalmente no Iraque. A Halliburton é uma empresa que hoje, no Brasil, mantém um de seus (ex) diretores como diretor da ANP (Nelson Narciso Filho). Esse homem tem acesso a dados secretos das jazidas de petróleo no Brasil”. A Blackwater recentemente criou uma nova empresa, a Xe Services and US Training Center. Ela mudou de nome para continuar fazendo todo o serviço “sujo” que os militares não podem fazer. Um exemplo de sua ação no Iraque foi a preparação de atentados para provocar a violência entre xiitas e sunitas.

A Halliburton teve como presidente Dick Cheney, ex-vice de George Bush, e se tornou notória pela rapinagem que promove no Iraque e pelos escândalos com dinheiro público nos EUA.

Sobre a Amazônia, Nery reproduziu ao jornal o relato feito por um militar da ativa na região: “Um coronel que comandava batalhão na região da (reserva indígena) Yanomami contou que estava fazendo patrulha, em um barco inflável com quatro homens, em um igarapé, quando avistou um sujeito armado com fuzil. Um tenente disse: ‘Tem mais um cara ali’. Eram cinco homens armados. O tenente advertiu: ‘coronel, é uma emboscada. Vamos retrair.’ Retraíram.

Nery perguntou ao coronel o que ele tinha feito: “Ele disse: ‘general, tive que ir ao distrito, pedir à juíza autorização para ir lá.’ Falei: ‘Meu caro, você, comandante de um batalhão no meio da Amazônia, perto da fronteira, responsável por nossa segurança, só pode entrar na área se a juíza autorizar? Ele respondeu: ‘É. Foi isso que o governo passado (Fernando Henrique) deixou para nós. Não podemos fazer nada em área indígena sem autorização da Justiça”.

“O coronel contou que pegou a autorização e voltou. Levou três horas para chegar ao igarapé, onde não tinha mais ninguém. Continuou em direção à fronteira. De repente, encontrou ancoradouro, com um cara loiro, de olhos azuis, fuzil nas costas, o esperando. Olhou para o lado: 10 lanchas e quatro aviões-anfíbio, no meio na selva. ‘Na sua área?’, perguntei. ‘É’, respondeu. Ele contou que abordou o homem: ‘Quem é você?”. Como resposta ouviu: ‘Sou oficial das forças especiais dos Estados Unidos da América do Norte’”.

S.C.

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