Ministro da Defesa da Coreia do Sul, Lee Yong Geul, declarou que “unidades de artilharia” de seu país “atiraram desde a ilha Baeknyeongdo, próxima à costa norte-coreana”
CÉCILE CHAMS*
No último 23 de novembro 4 pes-soas morreram na pequena ilha core-ana Yongpyong, reduzido espaço de terra, campo de treinamento das forças armadas sul-coreanas, du-rante manobras militares.
Quem começou?
É importante situar bem o lugar e o contexto desse incidente. A ilha que recebeu os tiros da Coreia do Norte não é uma simples ilha de pescadores. Eis como se refere a ela o The New York Times: “A ilha de Yongpyong se situa a 3 km da linha de demarcação norte – fronteira marítima contestada, que a Coreia do Norte não reconhece – e a apenas 12 km da costa norte-coreana. A ilha abriga uma guarnição de 1000 marinheiros e a marinha sul-coreana estacionou aí seus novos navios-patrulha equipados com mísseis teleguiados. O ataque sobre Yongpyong ocorreu no momento em que 70 mil soldados sul-coreanos começaram as manobras militares denominadas “salvaguardar a nação” (NYT, 23/11/2010). “Esses exercícios militares implicavam também na participação de 50 navios de guerra, 90 helicópteros, 500 aviões, e na presença da 31ª unidade de marines da força aérea dos EUA nas manobras”, revelou um quotidiano sul-coreano (The Hankyoreh, 24/11/2010).
A imprensa sul-coreana relatou que em 23 de novembro, segundo o ministério sul-coreano da Defesa, “o sul atirou 3.657 vezes, ou seja, 900 bombas por hora nas águas próximas à linha de demarcação ao norte” (The Hankyoreh, 24/11/2010). O ministro sul-coreano da Defesa, Lee Yong Geul, declarou que “unidades de artilharia haviam atirado desde uma bateria situada na ilha sul-coreana de Baeknyeongdo, próxima à costa norte-coreana”. Isso foi violentamente criticado por Pyongyang como “uma simulação de invasão do norte” e “um meio de provocar uma guerra” (NYT, 23/11/2010).
“A Coreia do Norte advertiu, então, ao sul que cessasse as manobras militares perto de sua fronteira marítima. Seul se recusou e começou seus tiros de artilharia nas águas contestadas. O Norte respondeu bombardeando a ilha de Yongpyong” (Associated Press, 23/11/2010).
Quem afundou o Cheonan?
Essas tensões estão sendo vividas desde 26 de março, quando a corveta sul-coreana Cheonan naufragou, provocando a morte de 46 tripulantes. A Coreia do Norte é igualmente acusada. Igualmente inúmeros observadores são céticos quanto a essa versão, inclusive na própria Coreia do Sul. Eles revelam que o naufrágio aconteceu durante um exercício militar conjunto entre a Coreia do Sul e os EUA numa zona totalmente monitorada por equipamentos sofisticados.
Em uma carta ao Conselho de Segurança da ONU, organizações pacifistas sul-coreanas consideravam “insensatez a Coreia do Sul pretender que a Coreia do Norte pudesse penetrar nas águas sul-coreanas, quebrar o Cheonan em dois e desaparecer sem que ninguém reparasse”. A carta avança no sentido da hipótese de uma colisão com um submarino americano (Solidarity for Peace and Reunification of Korea, 15/06/2010).
A hipótese de colisão com uma mina foi apontada por especialistas russos que examinaram os detritos no lugar.
A China sustentou também essa hipótese (The Hankyoreh, 27/07/2010).
O que disse a China?
A China se sente ela mesma visada, estima Ludo Brabander, responsável pela Associação pela Paz Verde, no jornal Wereld Morgen: “Pequim considera essas manobras parte de uma política de conter a China, no quadro de busca pelos EUA da dominação geo-estratégica. No final de setembro, o vice-almirante chinês Yin Zhuo destacou que ‘a série de exercícios militares iniciados pelos EUA e países vizinhos à China mostra que a presença militar americana na Ásia vai aumentar’. A meta desses exercícios militares é transformar em alvos vários países – a China, a Rússia, a Coreia do Norte – e traçar linhas estratégicas com os países aliados na região como o Japão e a Coreia do Sul. À China, que mantém boas relações com a Coreia do Norte, não lhe agrada ficar completamente cercada por um complexo de bases militares americanas e suas relações estratégicas com seus aliados na região (www.dewereldmorgen.be, 26/11/2010).
O que dizem os EUA?
Para resolver o conflito é necessário começar por estabelecer o diálogo. Ora, os EUA não querem o diálogo. Philip Crowley, porta-voz do Departamento de Estado, disse claramente em 1° de dezembro, durante uma conferência de imprensa: “Nós não estamos interessados no diálogo a seis partes” (Department of State, 1/12/2010).
“Todas as partes avançam com idéias diferentes sobre o modo de resolver a tensão”, explica Kim Keun Sik, especialista em Coreia do Norte da Universidade sul-coreana Kyungnam. “A Coreia do Norte e a China querem resolver a questão pelo diálogo, mas os EUA e a Coreia do Sul perguntam: ‘por que negociar agora?’, considerando melhor pressionar e tomar medidas punitivas”, acrescentou Kim (Associated Press, 12/12/2010).
Na realidade, a guerra da Coreia não foi totalmente encerrada em 1953. Um cessar-fogo, um armistício foi concluído entre a Coreia do Norte e os EUA, depois de três anos de guerra. Nenhum acordo de paz foi estabelecido entre as partes, o que sempre foi proposto pela Coreia do Norte.
O mesmo é reivindicado por todos aqueles que desejam a paz na região. É o caso do Comitê pelo Fim da Guerra da Coreia, que reúne uma série de organizações progressistas americanas e sul-coreanas. “Enquanto crescem as tensões é essencial pressionar o Presidente Barak Obama, laureado com o prêmio Nobel da Paz em 2009, para que pare de realizar exercícios militares conjuntos com os sul-coreanos e admita que tais manobras simulam uma guerra, aumentando inevitavelmente o risco de uma escalada inaceitável e incontrolável, ameaçando milhões de vidas. Negociações diretas são um primeiro passo para se chegar a um tratado ou acordo de paz, e são a única opção viável numa região extremamente milita-rizada, onde o confronto naval é recorrente, as fronteiras são contestadas e o contencioso não é resolvido” (National Campaign to End the Korea War: www.endthekoreanwar.org).
*Especialista em Coreia e Relações Internacionais. Este artigo foi publicado originalmente no jornal Solidaire, de Bruxelas, Bélgica em 7/12/2010
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